Mapa del sitio Portada Redacción Colabora Enlaces Buscador Correo
La insignia
30 de maio de 2007


Reflexões de aniversário


Luís Nassif
La Insignia. Brasil, maio de 2007.


Nasci às sete horas da noite de um dia 24 de maio. Era para ter nascido três dias antes, mas uma tia paterna, Marta, carola, rezou para que nascesse no dia de Nossa Senhora Auxiliadora. Ganhou a implicância eterna de dona Teresa, que atribuía à tia Marta os três dias que passou sofrendo o cão.

Não foi nascimento fácil. Nasci enrolado e dando trabalho. Na infância, dona Teresa teve reumatismo infeccioso, do qual resultou um sopro no coração. Quando se casou com seu Oscar, o Dr. Rowilson Flora avisou que ela não deveria engravidar: colocava em risco ou sua vida ou a da criança. Teimosa como ela só, dona Teresa resolveu insistir. Mais ainda: em casa. Se tivesse que morrer, que fosse em sua casa. Quase matou a multidão de parentes que ficou na sala de casa rezando por ela no dia 24.

Rezaram o dia inteiro. Às sete da noite Dr. Rowilson abriu a porta do quarto e apareceu com um bebê cabeçudo no colo. Suspense geral! Ele tinha dito que ou morreria a mãe ou o filho. Seu sorriso matou a charada: ambos estavam vivos.

Naquele dia, foi uma choradeira que perdurou por décadas. Quando nasceu minha vice-caçula a Bibi, 47 anos depois, levei-a para apresentar à minha avó Martha e minhas tias. Não tinha um mês de vida. Não era tão cabeçuda como fui, mas era cabeluda e tinha o rosto miúdo que aparecia nas minhas fotos de recém nascido. Foi outra choradeira, com as tias lembrando a vigília e o que pareceu ser um milagre de Nossa Senhora Auxiliadora.

Pai tardio, 34 anos, mas orgulhoso como ele só, meu pai me pegou no colo e nos dias seguintes saiu pela cidade visitando amigos e exibindo aquela obra-prima. Quando Jurandir Ferreira, farmacêutico, grande contista, seu ex-patrão, olhou com pouco caso para mim e fulminou - "esse cabeçudo é seu filho?" - ganhou a implicância do meu pai por exatos 20 anos.

A sina de cabeçudo e orelhudo me acompanhou por alguns anos. Minhas primas gozadoras, Rosa Maria e Cristina, contavam que, com 3 ou 4 anos, minha mãe me colocava sentado na mesa da copa. O peso da cabeça me fazia pender lentamente, que nem a torre de Pisa, e só parava quando batia no chão. Outra informação preciosa é que quando minha mãe me levava com ela ao mercadão, podia economizar uma cesta: meu chapéu substituía com folga.

Meu pai só se reaproximou de Jurandir uns dezoito anos depois, dia em que estávamos almoçando no Restaurante Sem-Sem, um carro atravessou o sinal, bateu no carro do Jurandir jogando-o no asfalto. Meu pai saiu correndo, acudiu Jurandir, levou-o para o hospital e se reconciliaram. Facilitou em muito o fato de minha cabeça ter ficado um pouco mais equilibrada com o tronco.

Deixei de ser cabeção, embora continuasse cabeçudo para sempre.

Mas esses dias me chamam a atenção para o significado do aniversário. Tenho fotos de meus aniversários no primário, cercado de coleguinhas, orgulhoso por poder soprar as velas, ser o anfitrião da meninada. A partir dos 13 ou 14 anos, deixei de ter as comemorações. Já vivia uma fase de intenso conflito com meu pai, o clima de casa não estava bom.

Em uma noite de aniversário, sete da noite, nada programado, a casa vazia, bateu o desespero. Passei a telefonar para colegas, para os amigos de pelada do São Benedito, para nos juntarmos e fazermos alguma coisa. O quê, nem sei. Festa, não dava para improvisar àquela hora, embora minha mãe tivesse me dados uns trocados para ir comprar Guaraná Caçula na vendinha. Ir para um boteco, nem pensar, para uma meninada de 13 anos. Uns três ou quatro gatos pingados toparam se reunir no largo do São Benedito, oito da noite para bater bola. Ficamos batendo bola, batendo bola, até o cansaço chegar e os gritos de dona Teresa, me chamando para dormir, me tirar daquele torpor.

Quando entrei na idade adulta, a comemoração do aniversário tornou-se sagrada. Podia ser apenas os amigos reunidos no Bar do Alemão, tomando chopp e cantando. Ou, à noite, a família das irmãs e as tias se reunindo em casa, e o violão comendo solto. Mas nenhum aniversário pode ser escondido ou ignorado. É momento único no ano, para um balanço, que pode ser dolorido ou reconfortante, mas é só seu.

Já mais velho, é hora de olhar para trás e relembrar mortos queridos; e olhar para frente, e se reconfortar com as sementes que são plantadas no caminho, filhos, livros, trabalho, amigos. Por isso, cada aniversário em casa, meu, da Ruiva, das meninonas e das menininhas, é comemorado como deve ser: uma celebração da família e da amizade, valores que se tornaram cada vez mais relevantes em um mundo louco e partido.



Portada | Iberoamérica | Internacional | Derechos Humanos | Cultura | Ecología | Economía | Sociedad Ciencia y tecnología | Diálogos | Especiales | Álbum | Cartas | Directorio | Redacción | Proyecto