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La insignia
25 de março de 2007


La Insígnia, 8 anos

O editor que é um co-autor


Urariano Mota
La Insignia. Brasil, março de 2006.


O aniversário de La Insígnia em 20 de março me faz estar presente com estas linhas.

Jesús Gómez Gutiérrez é uma pessoa que não conheço, de conhecimento de beber copas, de conversar e charlar em algum café. Nem mesmo sequer algum amigo comum nos apresentou. (Talvez até haja sido melhor assim, para a minha reputação.) Imagino Jesús Gómez como um indivíduo de 1 metro e 87, jovem na altura de 42 anos. Minto. Estou a mentir. Assim escrevi porque possuo informações de outras fontes. Na verdade, o senhor Jesús Gómez com quem de fato converso na imaginação é um sujeito de 53 anos -53, e não 54, porque os números ímpares são mais verossímeis- magro, estatura média, 1,67m, irritadiço e sanguíneo, com enciclopédias de cor na cabeça, principalmente de verbetes de História e das artes da Espanha. E com algumas surpresas também, distantes de enciclopédias, como a de ser admirador da Música Popular Brasileira, e mais detidamente de um gênio do samba, o nosso Paulinho da Viola. Este é o homem que conheço. Pero desejo escrever sobre outro, que se veio construindo diante de mim ao longo de quase 5 anos de colaboração em La Insígnia.

Como achar a medida? Quem tiver o metro, a régua e o compasso me ajude. Como falar do editor da revista, na sua revista, sujeito a seu gosto de editor, e portanto a seu arbítrio? Digamos que falo apenas para as senhoras Natalia Cervera, Carolina Broner, e para o senhor Francisco Rodero, do Conselho de Redação.. Certo? Ainda não, porque ainda resta um problema intocado. Como escrever sobre o editor sem cair na adulação, por um lado, e sem demonstrar rara e estranha independência, por outro, uma independência que é apenas exterior, de tal maneira que degenera em injustiça ou grosseria? Não adianta apelar a quem me conhece, que bem sabe não caber em mim o adulador. Adular não é a minha maior qualidade. O maior defeito também não. Nem mesmo alcanço a gentileza, para dizer um mínimo. Quando é possível, procuro apenas ser verdadeiro, e quando alcanço a felicidade, realizo esse alto objetivo. Desejarei então ser feliz no que segue.

Os dicionários são pobres na definição da palavra editor. Segundo o da Real Academia Española na web, editor é : "1. adj. Que edita... 3. m. y f. Persona que publica por medio de la imprenta u otro procedimiento una obra, ajena por lo regular, un periódico, un disco, etc., multiplicando los ejemplares. 4. m. y f. Persona que edita o adapta un texto". E editar, em seu primeiro significado, é "Publicar por medio de la imprenta o por otros procedimientos una obra, periódico, folleto, mapa, etc". O Dicionário Aurélio parece traduzir para o português a definição espanhola: "Adj. 1. Que edita...4. O responsável pelo ato de publicar textos de qualquer natureza, estampas, partituras, discos, etc." . O Houaiss lhe segue o caminho: "1 que ou o que edita 2 que ou aquele que tem como função publicar textos, estampas, partituras, discos etc.". Até parece que as grandes equipes de filólogos, lingüistas e lexicólogos são grandes equipes de especialistas em copiar. Quase nada de novo se "edita".

Ora. Os dicionaristas seriam melhores se retirassem o nariz de cima do papel para captar a experiência fora dos livros. O bom senso - essa entidade que paira acima dos dicionários - há muito sabe que o editor não é mais a tautologia do "editor é o que edita". Quem submete um texto a um, e não é publicado, ou então é publicado aos cortes, amputado, sabe que o editor é: "1. Um censor. 2. Um déspota. 3. Um ...". Mas quem recebe a graça de ter um texto publicado sabe que o editor é : "1. Um homem culto e justo", e se receber um - por todos os motivos - merecido destaque, reconhece e faz saber que o editor é "2. Um gênio". Claro, por todos os motivos. No entanto, quem está ou já esteve na pele de um desses déspotas ou gênios sabe que o editor é um sujeito que às vezes faz o papel de agulha para as linhas de quem ele edita. Como no apólogo "A agulha e a linha" de Machado de Assis:

"Era uma vez uma agulha, que disse a um novelo de linha:
- Por que está você com esse ar, toda cheia de si, toda enrolada, para fingir que vale alguma coisa neste mundo ? ...
... um alfinete, de cabeça grande e não menor experiência, murmurou à pobre agulha:
- Anda, aprende, tola. Cansas-te em abrir caminho para ela e ela é que vai gozar da vida, enquanto aí ficas na caixinha de costura. Faze como eu, que não abro caminho para ninguém. Onde me espetam, fico.
Contei esta história a um professor de melancolia, que me disse, abanado a cabeça:
- Também eu tenho servido de agulha a muita linha ordinária".

Se retirarmos a generalização da fala do alfinete no apólogo, nele há uma verdade que se aplica aos editores. Quantas vezes as linhas, os escritores, se julgam mais brilhantes que as agulhas abridoras de caminho? Pior, em muitos casos o escritor não se julga mais que, o brilho é todo dele, porque nada mais reluz que o próprio- e único, e jamais visto - imensurável talento. Nisso há, claro, no sujeito que pensa assim, um latifúndio, um monopólio estúpido do espírito. Isso lembra por vezes as histórias dos cientistas super-heróis, dos grandes cientistas. O trabalho coletivo, as parcerias invisíveis, parecem deixar de existir, como se a existência de um só Einstein fosse uma semente irrepetível, obrada por um ET... Pero desejo evocar outra característica olvidada do editor aquele que edita: as coisas que ele faz contra a própria vontade. Sim, esse homem que tudo pode na imaginação vulgar muitas vezes assina a edição de algo que não gostaria de assinar. E por que o faz, uma vez que não tem contas a prestar a ninguém, como se supõe não ter um editor de meio eletrônico? - Por razões que nem sempre estão vinculadas à qualidade - seja isso lá o que for - ele edita, com as vísceras no lugar da língua. Isso porque os editores também possuem sentimento - sim, acreditem, eles também possuem essa qualidade que os românticos creditam só e somente aos poetas. Isso ocorre também por razões políticas, táticas, estratégicas e que outras existam. Isso ocorre até em razão do tema, que por vezes vem mal escrito e maltratado como o diabo. Por exemplo, se neste exato instante Bush sofrer um atentado, muita coisa boa e ruim será publicada em todos os lugares e meios do mundo, sem pesar e pensar qualidade. A urgência obriga.

Mas prefiro destacar um fato que raro é notado. O papel fecundante que bons editores dividem com quem escreve. Percebem? Em mais de um caso eles fazem o papel de Baudelaire ao anunciar e abrir as portas para Edgar Allan Poe na Europa. Em mais de um caso eles funcionam como Balzac ao saudar num texto belo, forte e pleno o romance de Stendhal. Isso ocorre no sentido de que trazem à luz o que andava entre sombras. No sentido de que trazem à vida o que apenas existia, mas não era, para lembrar uma brilhante distinção entre ser e existir, entre o inanimado e a vida, apontada por Hegel. Se pensam que exagero, chego agora ao ponto em que pensei desde a primeira linha: esses editores não apenas dão à luz, eles não fazem apenas o papel de meio do que virá: eles também são autores do que vem e do que se produz. Isso ocorre, por um lado, pelo estímulo, pelo prêmio que dão a quem moureja, quando publicam o que antes apenas era um mundo em silêncio. Mundo de almas que se agitavam no íntimo e não encontravam a luz. Por outro lado, pela constância do escrever e escrever sempre, do escrever porque esta é a natureza de quem escreve, do escrever porque esta é a razão de viver e estar no mundo para quem carrega um fardo que não admite descanso, os melhores editores acabam por induzir um aperfeiçoamento do ofício de quem escreve.. E compreendam, isto não é uma nova metafísica. Na gênese de qualquer artista, de qualquer arte, não será difícil observar um crescimento do fazer, do fazer que é uma escola permanente, permanente, permanente, permanente.

Eu por mim tive e tenho tido muita sorte desde o dia em que publiquei o meu primeiro texto em La Insígnia. Isto se deu em 4 de junho de 2002. Por uma ironia que eu não desconfiava, chamava-se Último Dia. Foi o meu primeiro dia, o primeiro texto aqui, neste sítio que honra todos escritores e periodistas da América Latina e do mundo hispânico. Sem palavras, mas com atos práticos, renovados até a presente hora, sempre recebi de Jesús Gómez esta mensagem: "Escreves, que serás publicado. Escrevas, que nós te aguardamos. Escrevas da melhor maneira possível, com todos os metros, recursos, possibilidades e imaginação, sem problema escrevas, que receberás uma inteligência que te acompanha". Em razão de semelhante insígnia devo dizer que de lá até hoje creio haver melhorado muito. Muitas portas se abriram, muita humanidade pude conhecer desde 4 de junho de 2002. Por isso eu gostaria de, como um regalo, dividir este progresso, melhora e oportunidades recebidas com Jesús Gómez. Ele é um desses co-autores de quem falo desde o título na primeira linha. Regalo que lhe entrego com esta citação roubada em um texto seu, que lhe envio como uma dedicatória:

"Quien envía grandes regalos, quiere que se los devuelvan grandes. Con mis cacharros de arcilla no tendrás compromiso".



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