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La insignia
8 de junho de 2007


Tempo de autocrítica


Marco Aurélio Nogueira
Gramsci e o Brasil / La Insignia, junho de 2007.


A situação de efervescência e insatisfação em que se encontram as universidades estaduais de São Paulo tem um fato gerador -os confusos decretos do governo Serra- e muitas determinações. Não começou ontem e não tem data para terminar.

Instituições estratégicas, que trabalham com idéias e se orgulham de seus princípios e tradições, como as universidades, são espaços por onde correm rios profundos e tormentosos, sempre prestes a inundar a superfície. É esta característica, aliás, que dá à universidade a condição de usina de idéias. Crises, dissonâncias e movimento são seu oxigênio, sua força de propulsão. Precisamente por isto, a universidade é, ou deveria ser, o locus por excelência da tolerância, da criatividade e do diálogo. Argumentos de autoridade e imposição de decisões são procedimentos completamente estranhos a ela.

É fácil imaginar como este modo de ser se agita quando as condições gerais tornam-se elas próprias "fora de controle", intransparentes e pouco organizacionais.

As universidades públicas paulistas estão sendo acossadas, nos últimos anos, por demandas provenientes das distintas classes sociais e sobretudo das camadas mais exploradas da população. Vivem um momento extremamente positivo, rico de novidades, que reflete o que há de democratização na vida social e canaliza as expectativas crescentes que os jovens (e suas famílias) têm quanto à conquista de melhores patamares de formação e qualificação profissional. O ímpeto deste processo, porém, desorganiza suas bases tradicionais de trabalho e abala o que está instituído.

As universidades mostram-se perplexas diante disto. Reagem muitas vezes com horror elitista e paralisante. Outras vezes, com assistencialismo e expansão errática de cursos e vagas. São respostas que deixam a desejar e fazem com que cresçam a decepção, a insatisfação e as reivindicações. A instituição vai sendo, assim, devorada pelos novos contextos. Assiste à degradação de suas instalações e de suas práticas. A falta de ambientes adequados para o ensino e a pesquisa torna-se crítica, qualquer planejamento fica aquém das necessidades. Não se trata de uma questão de verbas, ainda que estas faltem sempre. A escassez é de iniciativa e de consenso.

O modelo da universidade pública está hoje em xeque. Engessa e deforma a universidade. O tripé ensino, pesquisa e extensão de serviços deveria ser urgentemente revisto e aperfeiçoado, pois foi desestruturado pela situação objetiva e pelos próprios critérios acadêmicos e sindicais que se sedimentaram nas instituições e nas áreas científicas. A massificação da universidade não encontra eco numa efetiva valorização da docência, professores são forçados a fazer pesquisa sem que existam recursos suficientes para isto e tendo de se submeter a critérios de produtividade burocráticos e corporativistas. As carreiras são corroídas pelo fim do mérito como referência. A dose de artificialismo e ineficiência é excessiva.

Já faz tempo que as universidades públicas estão sem uma causa, sem um projeto que as unifique, inflame e direcione. Olham o futuro como se ele fosse indecifrável. O que pretendem elas, além de fornecer ensino e pesquisa de qualidade? Como pensam em se inserir no desenvolvimento do país e no mundo globalizado? Que relação querem estabelecer com a sociedade e o Estado? Fala-se em autonomia, por exemplo, mas nunca se deixa claro o que isto realmente significa. Fala-se em qualidade, mas tudo termina por se resolver na exibição de indicadores. Fala-se em "comunidade acadêmica", mas jamais se diz onde ela está e quem a integra de fato. A letargia contamina estudantes, professores e funcionários.

As universidades estão momentaneamente sem condições de se autogovernar. Impressiona a falta de vontade e de vocação que seus quadros mais importantes, os professores, demonstram para dirigir a universidade. Há opções complicadas sendo tomadas pelo corpo docente, mas o contexto é francamente desfavorável aos dirigentes universitários. Empurra-os para o ramerrão administrativo, que acaba por consumi-los. Mesmo os melhores deles - que existem, e em número não desprezível - ficam com dificuldades para fixar projetos e propor discussões substantivas. Estas, por sua vez, quando tentadas, não encontram respaldo em nenhum segmento da universidade. Há um brutal déficit de liderança na universidade realmente existente. O sindicalismo a está fazendo sangrar a céu aberto. Há pouco debate intelectual. Os professores de hoje, na maioria, preferem se entregar à "política científica", à maximização e à gestão de suas agendas particulares. Dão menos importância para a construção institucional. E estão deixando de ser as referências políticas e intelectuais de estudantes e funcionários. Passaram assim a ser dirigidos por aqueles a quem deveriam dirigir.

Tais determinações não explicam a efervescência atual, mas podem ajudar a que se entenda como é que se chegou a ela. O tempo é de autocrítica e proposição, e exige que se deslinde o quadro objetivo e subjetivo em que nos encontramos.

Os equivocados e precipitados decretos do governo estadual, bem como sua demora em agir e a sucessão de erros táticos que cometeu, acenderam o rastilho e ajudaram a que o fogo se alastrasse. Mas o governo não responde sozinho pela crise. Depois de seu "decreto declaratório", ficou difícil responsabilizá-lo pela insatisfação. Ainda que sem dizê-lo, ele acusou o golpe. A universidade conquistou uma importante vitória.

O movimento, porém, não retrocederá, até porque suas reivindicações são amplas e espasmódicas,, não estão concatenadas entre si e nem seguem um plano articulado. As condições para sua passagem a um patamar superior, no entanto, estão dadas. Resta ver se ele dará este salto e começará a ajudar a universidade a definir seu futuro. O vento que sopra a favor só beneficia àqueles que sabem para onde ir.



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