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23 de janeiro de 2005 |
Fausto Wolff
Outro dia quase bati as botas. Fechado o expediente, fiquei bebendo uísque enquanto olhava o mar. À medida que bebia, mais o mar se agitava, me agitando também. Tive uma idéia genial e voltei ao computador, mas - vejam só - não conseguia escrever as frases direito. Era sempre aprotaledo pelas pavrolas. Retornei à janela, fiquei vendo o mar e tendo idéias geniais. Bebi mais algumas doses de uísque e, quando minha mulher voltou do trabalho (é, meus filhos, alguém tem de prover), contei-lhe o que ocorrera. Ela: ''Você teve um princípio de enfarte ou um princípio de isquemia'', e, sob meus discretos protestos, arrastou-me ao hospital.
Colocaram-me num leito ao lado de muitos outros, separados por um lençol. Braços furados por mil agulhas, fui vítima de um clister e do resultado do clister, tudo isso em meio a dezenas de pessoas que fingiam ignorar minha indiscreta performance. Lá pelas nove da manhã fugi do hospital e fui caminhando por Ipanema. Acabei num boteco em frente ao estúdio do Millôr, na Gomes Carneiro. Tomei um conhaque, comi um sanduíche de pernil e fumei um cigarro. Bateu-me a vontade de escrever um poeminha. Pedi lápis e caneta, mas as mãos não obedeciam ao cérebro. Só depois de desenhar mentalmente a letra é que conseguia reproduzi-la no papel e ainda assim muito mal. Desisti do poema e fui pedir a opinião do Millôr, que há 50 anos é uma espécie de irmão mais velho. Aconselhou-me a voltar ao hospital, o que fiz de táxi desta vez. As enfermeiras me receberam de braços abertos e nem me torturaram. Tivera mesmo uma isquemia. Três dias depois, feitos todos os exames, me mandaram embora e proibiram-me de fazer as três coisas de que mais gosto: ver Mannhattan connection, discutir com adolescentes e ler originais não solicitados. Caíram nessa? Não acredito. É isso mesmo que vocês pensaram. Estou proibido de fumar, beber e procriar, pois, no meio de uma dessas atividades, o sangue pode derrapar na veia e sair da pista da minha vida, que pode não ser grande coisa mas é minha. Por isso nunca mais fumei, bebi e procriei ao mesmo tempo. Tudo tem seu tempo certo. Por que conto esta história? Porque o Antonio Carlos Poerner, o alemón que veio do Manguêrrrra, disse que uma sua amiga havia caído durante um churrasco. Ela levantou-se imediatamente e culpou os saltos altos pela queda. Ingrid, este o seu nome, estava um pouco agitada e alguém sugeriu que chamassem um médico. Ela recusou. Saiu às cinco e meia e às seis o marido ligou dizendo que ela havia morrido. Como acho que os jornais deveriam ser os defensores dos que não têm advogado, além de órgãos de utilidade pública, vou salvar algumas vidas transmitindo informações. Se um neurologista conseguir examinar o paciente nas três horas após o derrame, poderá reverter o quadro. O truque é reconhecer, diagnosticar a anomalia e chamar o médico. Quando alguém der a impressão de que está tendo um derrame peça-lhe três coisas: 1) Sorria; 2) Levante ambos os braços; 3) Diga uma sentença simples coerentemente. Por exemplo: ''Adoro os seus livros'' ou ''Leio sempre suas colunas'' ou ''Está fazendo um calor do cão''. Se a pessoa tiver problemas para executar qualquer uma dessas tarefas chame um médico, ou melhor, um médico e ambulância. Segundo Poerner, após terem descoberto que um grupo de voluntários não médicos poderia identificar fraqueza facial, muscular e mental, investigadores incentivaram a população a aprender as três ações. Apresentaram suas conclusões à Associação Americana de Cardiologia, em fevereiro de 2005, e graças a isso inúmeras pessoas deixaram de conhecer Tupã antes do tempo. Toda vez que vejo um burguesão abastado desses enchendo a boca e dizendo que vivemos numa democracia e que vivemos esta vida de m.... por falta de educação, saúde e justiça, baixa em mim uma raiva mais pesada do que um trator. Quem não quer saúde, educação e justiça é exatamente a classe dominante, que não existiria com educação, saúde e justiça para todos. Mas deixem-me acabar a aula de hoje. Pode ser que Deus não exista e nesse caso não diremos ''Meu corpo'', mas ''Eu corpo''. Por que então em vez de ensinarem às crianças os afluentes do Amazonas, não ensinam a elas primeiros socorros e as três lições para reconhecer um derramado? Também serve ajudá-las a descobrir quem são, onde estão, onde vão e por que vão para onde pretendem ir. |
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