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La insignia
19 de setembro de 2006


CVRD: A multinacional brasileira


Lúcio Flávio Pinto (*)
Gramsci e o Brasil / La Insignia, agosto de 2006.


Nunca uma empresa brasileira ousou tanto e conquistou tanto quanto a Vale do Rio Doce. Ela está prestes a se tornar a segunda maior mineradora do planeta. Mas, se o seu jogo perigoso não der certo, quem pagará a conta? O Pará, que fornecerá cada vez mais riquezas nesse tabuleiro, deveria se interessar por ele.

A Companhia Vale do Rio Doce manifestou há duas semanas a disposição de gastar até 18 bilhões de dólares, em dinheiro vivo, à vista, pela compra da empresa canadense Inco, a maior produtora de níquel do mundo. A CVRD não existe, hoje, nesse mercado. Não produz ainda uma única grama de níquel. Com o lance, ocupará o lugar que atualmente é da Inco e pulará para a segunda posição entre as maiores mineradoras do planeta. Seu valor patrimonial passará de 60 bilhões para 77 bilhões de dólares, superando a Rio Tinto, cujo valor de mercado é de US$ 73 milhões, e a Anglo American (US$ 66 bilhões), que na semana passada também entrou na mira, segundo noticiário londrino. À sua frente só estará a BHP Billiton, avaliada em US$ 135 bilhões.

O que a Vale quer gastar com a Inco representa mais do que o PIB do Pará. A soma das riquezas do Estado, segundo seu último cálculo, não vai muito além de 30 bilhões - mas de reais. O PIB da CVRD já é quatro vezes maior, embora um terço de sua receita tenha sua origem no Pará, que é apenas o 11º em PIB, o 20º em desenvolvimento humano e o 22º em PIB per capita do Brasil, embora o 9º em população e o 2º em extensão. Também é o 2º em mineração, mas nos próximos anos deixará Minas Gerais para trás.

Nos últimos quatro anos, a Companhia Vale do Rio Doce, que é a empresa privada que mais investe no país, concluiu 16 novos projetos. Cinco deles, dos maiores, estavam no Pará: ampliou as produções de bauxita no Trombetas, de alumina na Alunorte (em duas etapas sucessivas, com a expansão 3 e parte da expansão 4 e 5) e de minério de ferro em Carajás, além de começar sua primeira mina de cobre, a do Sossego, em Carajás.

Nos próximos cinco anos a CVRD investirá 14 bilhões de dólares (o equivalente ao PIB do Pará) em 34 novos projetos, dos quais 16 se localizam no Pará (numericamente, de um terço, a proporção do Estado passará para quase metade do total de projetos; em valor, irá muito além). O rol desses projetos em território paraense é de impressionar:

- a arrematação, já neste ano, da expansão da Alunorte para 4,2 milhões de toneladas de alumina, consolidando-a como a maior empresa do mundo no setor, e a nova ampliação (em 2008), com as unidades 6 e 7, para 6,5 milhões de toneladas;

- a expansão da produção de minério de ferro em Carajás para 85 milhões (neste ano) e 100 milhões de toneladas (em 2007), equiparando-a ao Sistema Sul;

- o início da planta hidrometalúrgica de cobre de Carajás, que poderá viabilizar o maior empreendimento desse minério, o do Salobo, emperrado por problemas técnicos;

- a entrada em produção da mina de bauxita de Paragominas (no próximo ano), com 5,4 milhões de toneladas, sua expansão (em 2008) para 10 milhões e o novo crescimento (em 2009) para 15 milhões de toneladas, tornando-a de tamanho próximo à mina do Trombetas;

- os projetos de cobre de Carajás que entrarão em produção: o 118, o Salobo I e o Alemão (em 2009) e o Salobo II (em 2011), que colocarão o Brasil entre os quatro maiores produtores internacionais;

- a fábrica de alumina da ABC, em sociedade com os chineses, do porte da Alunorte, em 2009;

- a expansão da Albrás para alumínio, igualmente em 2009;

- e os projetos de níquel do Onça Puma (embora ainda não aprovado pelo Conselho de Administração da empresa) e do Vermelho, ambos em 2008.

As duas minas paraenses, somadas às canadenses da Inco, farão com que a produção desse metal pela Vale alcance 402 mil toneladas anuais de concentrado, muito mais do que a da segunda colocada, a Noriesk Nickel, com 265 mil toneladas. A CVRD, que já é a primeira em minério de ferro, deverá se tornar a 2ª em bauxita e a 3ª em alumina. Terá peso jamais alcançado por qualquer outra empresa brasileira no mercado internacional. Será, de fato, a única multinacional brasileira.

A audácia e a agressividade que têm marcado o desempenho mais recente da Vale produzirão efeitos não só sobre a economia interna da empresa, mas do próprio país e dos Estados nos quais sua presença é mais forte, sobretudo o Pará. Se a oferta de compra hostil for aceita pelos acionistas da Inco, o níquel, que não integra a receita da ex-estatal, passará a ser sua segunda maior fonte de faturamento, chegando a 20% do total, enquanto o percentual do minério de ferro baixará de 74% para 56%. Cairão percentualmente o alumínio (de 11% para 8%) e a logística (de 9% para 7%), enquanto a presença do cobre se acentuará (de 3% para 5%).

A Ásia continuará a ser o principal destino dos produtos da Vale depois desse lance de compra (passará de 29% para 30%), mas a América do Norte, ingressando no raio de ação da empresa, terá crescimento exponencial, indo de 10% para 17%, enquanto o mercado brasileiro se reduzirá (de 27% para 20%). A Europa permanecerá como o segundo destino, mas em retração (de 28% para 25%).

A América do Norte (devido ao Canadá) será a segunda região de maior presença da Vale (que hoje é nula e poderá representar no futuro 27% de sua receita), com um significativo deslocamento do Brasil (que responde por 98% da geração de produtos e poderá ficar com 60%).

Esse incremento quase febril da Vale do Rio Doce devia ser acompanhado de perto pelas autoridades brasileiras e, na medida do possível (e também do impossível de hoje), pelo Pará. Afinal, são as riquezas físicas do Estado que estão sendo transferidas para o exterior, em escala aceleradamente crescente, numa teia de interesses que escapa por completo até ao conhecimento do Estado. Esse encadeamento, que multiplicará o endividamento da Vale, irá até financiadores internacionais, criando uma fonte de insegurança em potencial.

Se as iniciativas da atual diretoria da CVRD derem certo, a empresa dará um salto excepcional, invejável, como nenhuma outra conseguiu no Brasil. Não quer dizer que seus "parceiros", conscientes ou compulsórios, a acompanharão nessa trajetória de sucesso, restando-lhes, talvez, apenas as sobras dessas conquistas.

Mas, e se o lance ousado der errado? A Companhia Vale do Rio Doce pode estar apostando fichas em demasia numa só casa, a da China. É um jogo complicado e perigoso, mesmo para uma multinacional, ainda mais neófita, como a brasileira. De qualquer maneira, convém não ficar à distância do tabuleiro. A Vale, por enquanto, joga só. E ganha sempre sozinha.

Mas... e se perder?


(*) Lúcio Flávio Pinto é o editor do Jornal Pessoal, de Belém, e autor de Guerra Amazônica (2005).



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