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La insignia
2 de setembro de 2006


Brasil

Racionamento na «capital ecológica» do país


Felipe A. P. L. Costa (*)
La Insignia. Brasil, setembro de 2006.


O consumo exagerado e o desperdício de água não são privilégios de nenhuma cidade ou estado brasileiro. Tanto é assim que até mesmo Curitiba, a badalada "capital ecológica" do país, teve de adotar nesse inverno um programa de racionamento de água, sob pena de ver entrar em colapso todo o seu sistema de abastecimento.

O regime de racionamento de água em Curitiba, que teve início no último dia 04/08, não passou despercebido da imprensa nacional - ver, por exemplo, "Estiagem provoca racionamento de água em Curitiba" (1) (publicada pela Agência Estado, em 04/08). A imprensa local, claro, vem acompanhando o desenrolar dos acontecimentos - ver, por exemplo, "Sanepar adia para sábado decisão sobre alteração no racionamento" (2) (publicada pelo jornal Gazeta do Povo nesta sexta feira, 01/09).

No sítio eletrônico da empresa que está por trás disso tudo, a Sanepar (Companhia de Saneamento do Paraná) (3), também é possível encontrar um noticiário sobre o que se passa com o sistema de abastecimento de água da Região Metropolitana de Curitiba (RMC). Eis as pérolas que encontrei no noticiário da empresa (grifo meu; acessos em 13/08 e 01/09):

-"Falta de chuva obriga Sanepar a implantar rodízio no abastecimento de água na RMC"; e
-"O rodízio no fornecimento de água por causa da seca, retorna para o Grupo 1" [a região atendida pelas barragens Piraquara e Iraí foi dividida em sete grupos, um para cada dia da semana; a região atendida pela barragem do Passaúna não foi incluída no rodízio].

De acordo com a Sanepar, a produção média necessária para atender a demanda diária da Região Metropolitana de Curitiba é de aproximadamente 500 mil metros cúbicos de água. Com o rodízio, a empresa espera reduzir o consumo diário em 15 por cento ou cerca de 70 mil metros cúbicos de água. Se esse percentual for alcançado, a cada sete dias de rodízio consegue-se economizar o equivalente ao volume extraído das barragens em um dia.


Em busca da causa perdida

O clima do estado do Paraná se caracteriza por um verão (dezembro a março) quente e chuvoso e um inverno (junho a setembro) frio e seco. Em certos anos, os valores máximo e mínimo podem estar um pouco deslocados, mas esse é o padrão geral para o estado. Trocando em miúdos, a escassez de chuvas durante o inverno é um fenômeno natural, conhecido e perfeitamente previsível.

Isso implica, entre outras coisas, no seguinte: todo e qualquer empreendimento humano que seja influenciável (ainda que remotamente) por essa variação sazonal deve necessariamente incorporá-la ao rol das variáveis sob prévia consideração. Quer dizer, a escassez sazonal de chuvas não é ela própria a causa de nenhum apagão ou racionamento que ocorra ou venha a ocorrer, seja no fornecimento de energia elétrica ou de água.

A rigor, a origem do problema está ligada a outros fatores, dois dos quais merecem especial atenção: consumo excessivo e desperdício de recursos. Se esses hábitos permanecem inalterados, principalmente na época do ano durante a qual os recursos são mais escassos, poderemos então apostar que situações como a que Curitiba vem enfrentando hoje serão cada vez mais freqüentes nos anos vindouros. É preocupante. Afinal, se temos racionamento de água em uma cidade tida como exemplo para os demais centros urbanos do país, como será que as coisas andam em lugares ainda mais caóticos?

Por exemplo, nas últimas duas décadas, moradores da cidade de São Paulo - o maior aglomerado urbano do país - se habituaram a viver sob um regime semipermanente de racionamento: no inverno, por causa da "estiagem"; no verão, por causa da elevação na taxa de consumo per capita. A exemplo dos congestionamentos no trânsito, parece que o racionamento vai mesmo se converter em mais um tormento rotineiro na vida dos paulistanos.

Quando governantes e administradores falam em racionar - e isso vale não só para Curitiba ou São Paulo, mas para qualquer cidade do país -, eles não estão propriamente falando em racionalizar o sistema (o que talvez viesse a contornar o problema de modo efetivo). Na verdade, estão apenas dizendo que é necessário dosar o acesso (anárquico) a uma fonte finita de recursos (espaço, água etc.). Entre outras coisas, há por trás do racionamento um acentuado ingrediente classista: bairros pobres tendem a ficar sem água mais freqüentemente do que bairros ricos instalados em zonas topograficamente equivalentes de uma mesma cidade.


Algumas medidas corretivas

A questão da falta de água tende a se tornar um problema crônico nos grandes centros urbanos, principalmente naqueles lugares onde medidas apropriadas não são devidamente implementadas. E essas medidas corretivas não dependem nem um pouco da construção de novos reservatórios ou barragens. Algumas dessas medidas têm a ver, por exemplo, com o restabelecimento da recarga natural do estoque subterrâneo de água. Nesse sentido, cedo ou tarde vamos ter de enfrentar (e reverter) a questão da impermeabilização excessiva do solo urbano. Outro importante conjunto de medidas tem a ver com a proteção de áreas ecologicamente sensíveis, como nascentes e o entorno de reservatórios e cursos d'água.

Por fim, um outro conjunto de medidas terá de lidar seriamente com a questão do desperdício. No caso dos centros urbanos, por exemplo, não há o menor sentido em continuarmos gastando tanta água tratada para fazer fluir o sistema de coleta de esgoto. Também não tem cabimento continuar tolerando o desperdício de água subterrânea não-tratada, como o que é promovido pelos postos de combustível que oferecem "duchas grátis" aos seus clientes. Nesses casos, a ducha só é grátis porque a água está sendo captada por meio da exploração de poços artesianos irregulares. De resto, o "grátis" só vale para consumidores individuais no presente, pois, em um futuro que se avizinha cada vez mais próximo, a conta será rateada entre muitos.


Notas

(*) Biólogo, autor do livro Ecologia, evolução & o valor das pequenas coisas (2003) e ex-coordenador técnico da Rede Nacional Pró-Unidades de Conservação (http://www.redeprouc.org.br).

(1) http://www.estadao.com.br/ultimas/cidades/noticias/2006/ago/04/402.htm
(2) http://canais.ondarpc.com.br/noticias/parana/conteudo.phtml?id=595617
(3) http://www.sanepar.com.br



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