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La insignia
23 de fevereiro de 2005


Mudanças climáticas


Temístocles Marcelos Neto (*)
Agência CUT. Brasil, fevereiro de 2005.



A última Conferência das Partes (CoP) da Convenção- Quadro sobre Mudanças Climáticas deve deixar preocupados os trabalhadores e trabalhadoras. Mais uma vez, foram reforçados os mecanismos comerciais para atingir as metas de redução das emissões de gases do efeito estufa, tal como o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), e não se discutiu a tão necessária mudança dos insustentáveis padrões atuais de produção e consumo.

É hora de os trabalhadores e das entidades organizadas do sindicalismo, do movimento de mulheres, dos sem-terra e de outros movimentos sociais, entrarem em campo para uma partida decisiva: acompanhar e opinar sobre as negociações internacionais em torno de medidas para promover a redução das emissões de gases do efeito estufa, pois os rumos que vêm seguindo essas negociações pelos governos não são promissores para a vida do planeta. Isto se observou durante a décima reunião da Conferência das Partes (CoP 10), de 6 a 17 de dezembro passado, na bela cidade de Buenos Aires.

Para os trabalhadores dos países em desenvolvimento, provavelmente nem haverá tempo para um bom "aquecimento" antes da partida. Isto porque o jogo já foi iniciado. A estes países, com a entrada em vigor do tão falado e pouco debatido Protocolo de Quioto, será oferecida, pelos governos de países industrializados e empresários, toda sorte de "comércio de carbono". Neste momento da partida, em Buenos Aires, se apresentaram,novamente, liderados pelo governo e empresas norte-americanos, os mesmos interesses econômicos que jogaram pesado para bloquear todo e qualquer esforço em dar início às negociações internacionais, no âmbito das Nações Unidas, para a construção de um instrumento que tratasse das mudanças climáticas em nosso planeta.


Os riscos do MDL

Assim, os projetos de Mecanismos de Desenvolvimento Limpo - MDL - que serão propostos de forma acelerada, pelos países ricos e suas multinacionais, aos países da África, Ásia e América Latina, a partir deste ano, com a vigência do Protocolo de Quioto, devem ser objeto de atenção e controle profundos pelos trabalhadores e suas entidades. Do contrário, os MDL não promoverão nem desenvolvimento limpo, nem desenvolvimento sustentável, mas sim a riqueza e o marketing de alguns. E, certamente, aprofundarão a pobreza de outros.

O MDL é um dos componentes do atual regime internacional de clima que, por sua vez, foi fruto de longas reuniões iniciadas desde 1990 quando a ONU criou o comitê intergovernamental de negociação para a Convenção- Quadro sobre Mudança de Clima. Representações de mais de 150 países se envolveram nesta tarefa. Concluída em maio de 1992, a Convenção teve de aguardar todo tipo de burocracia de governos e parlamentos nacionais para, enfim, entrar em vigor em maio de 1994. Por curiosidade o Congresso brasileiro fez a ratificação apenas em fevereiro de 1994.

A Convenção de Mudança de Clima estabeleceu, entre outras coisas, que os países desenvolvidos, deveriam reduzir até o ano 2000 suas emissões de gases do efeito estufa aos níveis das emissões de 1990. Aos países em desenvolvimento não foram estabelecidas obrigações de promover redução das emissões dos gases do efeito estufa. Estes países podem continuar a aumentar suas emissões, mas devem fazê-lo em ritmo menor para contribuir, assim, para o cumprimento dos objetivos da Convenção. Todos os países, em desenvolvimento e industrializados, têm compromissos comuns, inclusive de divulgarem o inventário das fontes de emissões e sumidouros destes gases, bem como divulgarem medidas tomadas ou a serem tomadas em suas políticas setoriais que busquem interagir com o esforço internacional de estabilizar a emissão destes gases. Chamou a atenção durante a CoP-10 a divulgação da comunicação nacional brasileira - o inventário de emissões - com altos índices de desmatamento na Amazônia, responsável pela maior parte das emissões brasileiras.


O caminho árduo da entrada em vigor do Protocolo de Quioto

Em dezembro de 1997 foi realizada a CoP-3, em Quioto, Japão. Nesta terceira reunião, assim como na anterior, foi constatado o óbvio: os nossos primos yankees e os nossos "bons" colonizadores europeus não haviam adotado medidas que possibilitassem o cumprimento das obrigações previstas na Convenção. Qual foi a saída? O Protocolo de Quioto.

No Protocolo de Quioto foram adotados novos prazos e metas de redução de emissões de gases do efeito estufa para os países industrializados. Agora, deveriam reduzir, em média, cinco por cento em relação aos níveis de 1990 das emissões de gases do efeito estufa, meta a ser alcançada no período de 2008 a 2012. Eu destacaria aqui, também, outra novidade do Protocolo de Quioto: introduziu elementos de "flexibilização" no regime internacional de clima: as emissões não são absolutas e nem precisam ser nos territórios dos respectivos países.

A meta pode contar com emissões obtidas em outros países, e tais "ganhos" serem contabilizados segundo critérios e instrumentos do Protocolo. Entre eles, um elemento de mercado denominado Mecanismo de Desenvolvimento Limpo' - MDL. O MDL não é, nada mais nada menos, que a possibilidade de comercialização, entre países e empresas, das obrigações de redução das emissões de gases do efeito estufa, através dos chamados créditos de carbono.


O descumprimento de metas debe ser denunciado

É bom ressaltar na "súmula do jogo" que: 1) a introdução deste mecanismo de mercado, o MDL, em detrimento de um Fundo de Desenvolvimento Limpo, foi uma exigência dos EUA. Ao trocar o "Fundo" por "mecanismo", troca-se também a perspectiva de regulação e controle pela imprevisibilidade e pela perversão do capital e do sacrossanto mercado; e, 2) os governos dos países em desenvolvimento e suas mídias não fizeram repercutir suficientemente o flagrante descumprimento dos países industrializados em relação à Convenção de Mudança Climática.

Seria o caso de se comparar com o que aconteceria caso os países em desenvolvimento assim procedessem em relação aos prazos para pagamento de suas dívidas junto ao FMI. A reação seria diferente, inclusive da mídia de nossos países.

Retornando ao Protocolo, vale dizer que ele não estabeleceu compromissos adicionais para os países em desenvolvimento, apenas reafirmou os compromissos da Convenção- Quadro de Mudança de Clima, que continua em vigor. Observe-se então que os EUA, mesmo não ratificando o Protocolo de Quioto, ainda devem ser cobrados por seu compromisso em relação à Convenção.

Mas sobre isso há silêncio da mídia e dos demais países. O Protocolo também estabeleceu que, para sua entrada em vigor, deveria ser ratificado por países que, juntos, fossem responsáveis por 55% das emissões de CO² no planeta. Finalmente, em 2004, com a ratificação pela Rússia, foi atingido este percentual.

Antes que esta partida chegue aos 44 minutos do segundo tempo, reitero aqui a questão inicial: é hora dos trabalhadores entrarem no jogo, nas arquibancadas e nas quatro linhas do campo. É bom logo ir falando aos burocratas das tesourarias de suas entidades que é preciso pagar ingresso, mesmo que seja a preços simbólicos, como foi na última partida do glorioso Atlético Mineiro com o São Caetano no campeonato brasileiro. Quem assistiu àquela partida sabe que, sem a torcida, o time mineiro seria rebaixado para a segunda divisão. Com a torcida, ganharia de qualquer time naquele domingo.

A conferência de Buenos Aires, a julgar pela cobertura da mídia brasileira, foi considerada uma partida de segunda ou terceira divisão. Para a próxima CoP, que acontecerá no Canadá no fim deste ano, serão precisos muitos jornalistas do perfil do nosso excelente Washington Novaes. Será preciso trazer a cobertura dos cadernos de meio ambiente ou ciência e tecnologia para os cadernos de política e economia. Já a nossa imprensa popular deve se preparar mais, desde já.


A vida do planeta está em jogo

Em relação à composição da delegação dos governos nacionais, inclusive o Brasil, vai uma sugestão: enviem, ao menos para o painel científico (um dos momentos da CoP), não apenas os ministros de Ciência e Tecnologia, mas também os ministros da área econômica e os presidentes de bancos federais.

Não enviem apenas os ministros de Meio Ambiente mas também os ministros da Casa Civil. Talvez, assim, os governos consigam entender o que está em jogo nesta partida: não são as retóricas, mas são os inconfessáveis interesses particularistas dos capitalistas rentistas ou industriais.

Talvez assim empurrados pelas imensas arquibancadas, os governos saberão que o que é necessário é a imediata mudança dos atuais padrões insustentáveis e desiguais de produção e de consumo. O que está em jogo é a vida no planeta, as vidas dos seus fi lhos, netas e bisnetas. Contudo, eu gostaria de terminar falando de esperança. De que a sabedoria dos nossos indígenas latino- americanos nos ajude a manter e fortalecer a luta em defesa de um mundo melhor.

Assim se expressaram os editores do livro Toma mi corazón y rompe el silencio (Tituaña, Ecuador, 2003), sobre o autor, líder do Movimento Indígena Pachakutik do Equador: "Auki Tituaña suenã y recuerda, agradece y exige, sufre y celebra, ora y blasfema, ama y convoca... Es una voz nueva y antigua a la vez: una renovación y una continuación de la milenaria voz indígena latinoamericana, que busca transmitirnos, desde su convicción humanista y de paz, la más grande y humilde de todas las obligaciones humanas: la esperanza."

(*) Coordenador da Comissão Nacional de Meio Ambiente da CUT, Secretário executivo do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Desenvolvimento Sustentável (FBOMS)



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