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La insignia
3 de junho del 2005


UE

Há vida depois da morte da Constituição Européia?


Joaquín Roy (*)
Envolverde. Brasil, junho de 2005.


Miami, maio/2005 - Por uma maioria de 54,87%, e participação de 70%, o eleitorado francês rejeitou o projeto de Constituição Européia. Considerando que a legislação exige que seja ratificada por todos e por cada um dos países-membros da UE, legalmente o projeto está liquidado. Agora, resta somente analisar o que fazer daqui para frente não somente com a legislação vigente, mas com a própria UE. Para dizer claramente: há vida depois da morte da Constituição?

Há um futuro para a União Européia. Entre outras razões, a UE desfruta de um sólido legado do passado, e seu presente dura tanto quanto a etapa atual do processo de ratificação da Constituição. O bloco não foi criado ou morreu no domingo com o referendo francês, nem tampouco com o holandês desta quarta-feira. Esta é a experiência de integração e cooperação entre os Estados mais ambicioso da história, que merece respeito, análise ponderada e, sobretudo, esperança. Deve ser encarada em diferentes níveis e por setores: legal, político e sociológico.

Primeiro, desde seu nascimento a UE é uma comunidade de direito. Como tal, deve respeitar o ordenamento atual que prevê completar o processo de ratificação por meio de referendo ou processo parlamentar em todos e em cada um dos Estados-membro. Frear o exercício em andamento, privando mais de uma dezena de países de poderem se expressar, é um ato de arrogância que somente certos líderes britânicos ou políticos pusilânimes são capazes de cometer. O projeto de Constituição, referendado por todos os governos é claríssimo: o processo de ratificação somente terminará em outubro de 2006, quando todos os cidadãos (ou seus representantes parlamentares) tiverem tido a oportunidade de se expressar.

Fazer o contrário (considerar o voto francês ou o holandês como um plebiscito geral) é considerar orwellianamente que alguns cidadãos são mais iguais do que outros e que em Marselha ou Roterdã votam por Varsóvia ou Praga. Este detalhe jurídico não pode ser ignorado de maneira alguma, a não ser que se pretenda violar o ordenamento e se opte quase que por uma espécie de golpe de Estado, mascarado por uma decisão do Conselho Europeu, único organismo capaz de enfrentar tal decisão de deter o restante dos referendos ou das ratificações parlamentares.

De todo modo, como unidade de direito, a União Européia ainda pode funcionar mediante a aplicação do Tratado de Nice, e as regulamentações vigentes dos tratados anteriores. De fato, muitos dos aspectos continuariam válidos, com a Constituição aprovada até 2009 e inclusive mais além. Portanto, havia e há vida após a Constituição.

Em segundo lugar, é certo que o terremoto causado pela rejeição francesa e o possível exercício negativo na Holanda, tem algumas conseqüências políticas, com notáveis repercussões legais no futuro, não somente para o processo da integração européia, mas também potencialmente para redefinir a própria natureza da UE. Pode-se considerar que o voto negativo de um pequeno país como a Holanda tem remédio e uma possível justificativa excepcional. Mas a bofetada à Constituição é difícil de encaixar fleumaticamente.

Também se pode dizer que pouco mais da metade do 70% do eleitorado que votou não tem direito de deter o projeto constitucional. Pensando friamente, 54,87% dos eleitores franceses efetivos, apenas 15 milhões (para não falar do minúsculo número dos eleitores holandeses), se podem permitir o luxo de emendar os já mais de 220 milhões de europeus que aprovaram (em referendo ou pelo parlamento) o texto. É absurdo e injusto, mas assim é a lei.

Agora já é tarde, mas em uma UE que segue no caminho de reduzir drasticamente as decisões sujeitas à unanimidade é contraditório que não se contemple tomar passos tão importantes mediante uma eleição ou referendo global, sem barreiras nacionais. Considerados em bloco, os europeus aprovariam comodamente por maioria o texto. Esse detalhe está intimamente relacionado com o debate entre o intergovernamental livre comércio e a verdadeira supranacionalidade integradora.

Em nível sociológico, a análise é mais complexa e convém meditar seriamente não somente sobre o resultado do referendo, mas sobretudo no que está intimamente ligado ao segundo nível. É recomendável internacionalizar esta aparente ocorrência: o problema da democracia é o povo. Nem os cidadãos leram a Constituição, não lhes interessa, nem estão preparados para fazê-lo.

As massas não lêem análises de opinião nem tratados filosóficos. Tampouco lêem as constituições de seus próprios países, nem os códigos penais, ou comerciais, e devem diariamente procurar advogados e banqueiros. Por que então este exercício se deve fazer de forma diferente? Porque os responsáveis políticos, em alguns casos emblemáticos, como o francês (e daí Chirac poder demitir), irresponsavelmente brincaram com fogo, escolheram um procedimento totalmente demagógico e deixaram nas mãos dos eleitores uma decisão diferente do objetivo original.

O resultado é que o processo de ratificação da Constituição Européia é considerado um plebiscito, contra ou a favor do governo de turno. Nunca é uma avaliação de um texto, mal explicado e mal internalizado. É o mesmo problema endemicamente sofrido pelas eleições para o Parlamento Europeu, que somente acontecem como um castigo ou um apoio aos partidos nacionais.

Entretanto, deve-se esperar o fim do processo, em novembro de 2006. Se pelo menos 20 (80% de 25) países ratificarem a Constituição, o Conselho Europeu decidirá quais alternativas existem. Entre elas, fora da vigência do ordenamento atual, destaca-se o resgate de alguns aspectos do texto em debate, sobretudo a presidência permanente da UE, ministro para Assuntos Exteriores, votação simplificada e o método da cooperação reforçada entre alguns membros que sirvam como motor para a integração futura.

Mas haverá danos colaterais em razão do desastre francês. Em primeiro lugar, o processo de ampliação geral foi tocado. Croácia e alguns outros países, principalmente Turquia, deverão esperar melhores dias. Em nível orçamentário, haverá reduções em ajuda interna e externa. Quanto ao exterior, a imagem da União Européia será afetada, mas tudo dependerá de como vai se consolidar a trama institucional para que a UE, improvavelmente, deixe de liderar o mundo no tocante ao modelo de integração ou como ponto de referência.


(*) Joaquín Roy é catedrático Jean Monnet e diretor do Centro da União Européia da Universidade de Miami.



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