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La insignia
16 de junho de 2005


Brasil

As confissões do deputado


Luiz Antonio Magalhães
Observatório. Brasil, junho de 2005.


O deputado federal Roberto Jefferson, presidente do PTB (ao menos até o fechamento deste texto), é um homem dramático. Advogado criminalista e político formado na tradição do pragmatismo absoluto, Jefferson é também um profissional frio, calculista e consciente do peso das palavras que profere.

Na segunda entrevista concedida à Folha de S. Paulo, publicada na edição de domingo (12/6), mais uma vez com o objetivo de denunciar o suposto esquema do pagamento de um "mensalão" a deputados do PL e PP - de acordo com a denúncia, uma propina paga pelo tesoureiro do PT com o objetivo de garantir o apoio dos aliados em votações de interesse do governo -, Jefferson atirou em várias frentes. Envolveu novos personagens, bateu forte no ministro-chefe da Casa Civil, José Dirceu, e acusou o líder do PP, José Janene, de participar ativamente da negociata.

Em outras palavras, fez jus à alcunha de "homem-bomba" ou, na versão politicamente incorreta, de "homem-ventilador". Garantiu para si, pela segunda vez em duas semanas, a manchete da Folha de S. Paulo. Mas tratou de alertar que não tem provas do que está denunciando: disse que não possui qualquer tipo de fita gravada ou documento que comprove as pesadas acusações que fez aos colegas da Câmara, aumentando assim a expectativa para o depoimento formal que faria na Comissão de Ética da Casa nesta terça-feira (14).


Imagem comprometida

Jefferson pode ser muita coisa, mas burro certamente não é. Tem informações de sobra para avaliar o tamanho da encrenca em que se meteu e muitas vezes suas afirmações não se destinam ao grande público, mas a poucos entendidos. No meio dos recados cifrados e insinuações, o deputado trabalhista disparou, na sua segunda entrevista concedida à Folha, um petardo na direção da mídia brasileira. Mais especificamente em direção à revista Veja, ao jornal O Globo e à TV Globo. O trecho a seguir merece ser lido com atenção, pois é revelador. Com a palavra, Roberto Jefferson:

"Eu coloquei ao Zé Dirceu tudo o que eu já disse a você na entrevista passada. Nesse ínterim, sobe um boletim da Polícia Federal, trazido pelo advogado do PTB, dizendo que o Mauricio Marinho [funcionário dos Correios flagrado em gravação recebendo propina e citando Jefferson] descredenciara a fita. Eu falei: 'Se é assim, eu não tenho nenhum problema em retirar a assinatura da CPI. Mas Zé Dirceu, vocês, que esticaram a corda até romper, me expliquem como foi essa coisa de Furnas'.

"Aí ele repetiu a conversa do Chinaglia. Que recebeu pressão do Severino e do Janene, com ameaça de assinar a CPI, e que adiante eles reconduziriam o Pirandel.

"Eu falei: 'Mas me importa a restauração da minha honra. A 'Veja' está fazendo um verdadeiro linchamento'. Ele respondeu: 'Roberto, na 'Veja' não tenho nenhuma ação, porque a 'Veja' é tucana'. Eu falei: 'Mas 'O Globo' e a Globo estão repetindo o linchamento'. Ele falou: 'No 'Globo' eu falo por cima. Dá para segurar'.

"Retirar a assinatura foi o meu maior erro. Depois que fiz isso, recrudesceu o noticiário contra o PTB. Eu entendi que foi uma armadilha do Zé Dirceu para mim. Recrudesceu o noticiário, e eu vi claramente a mão do governo." (destaque meu)

Do que é possível entender do diálogo entre o ministro José Dirceu e o deputado Jefferson, segundo a versão do presidente do PTB, o comportamento atual da imprensa brasileira não difere tanto assim daquele observado nas já longínquas décadas de 1950 e 60, quando havia os veículos francamente de oposição ao governo, que manipulavam o noticiário a fim de solapar a governabilidade, e os chamados "chapa-branca", que também manipulavam as notícias, mas para defender o poderoso de plantão.

Desde o final da ditadura militar, praticamente todos os jornais, rádios e emissoras de televisão do país se esforçam para vender a imagem de veículos independentes, isentos e altivos no compromisso com a busca da verdade - a própria Folha já usou por bom tempo o inusitado slogan "Folha, de rabo preso com o leitor". Tal imagem de independência cai por terra no depoimento de Jefferson. Em poucas linhas, ele desconstrói, para usar uma palavra da moda na política, o papel de dois grandes veículos como intermediários isentos entre os fatos e os leitores. Nas palavras do deputado do PTB, pelo menos a revista Veja, o jornal O Globo e a TV Globo são qualquer outra coisa, mas isentos é que não são.


No momento certo

Evidentemente, não é fácil dar crédito total a um bufão do quilate de Roberto Jefferson, mas é forçoso reconhecer que, no tocante ao diálogo acima reproduzido sobre o comportamento a imprensa brasileira, "se non è vero, è bene trovato", como diriam os italianos.

No tocante à Veja, supostamente qualificada de tucana pelo ministro Dirceu, sempre segundo o relato de Jefferson, o qualificativo é até singelo. Na verdade, a revista sempre foi agressivamente antipetista. Durante a campanha de 2002, conta uma ex-profissional que deixou a casa horrorizada, um dos altos editores do semanário costumava passear na redação perguntando aos repórteres "o que é que nós temos para f... o operário nesta semana".

Nem é preciso avançar muito na análise do panfletão anti-PT editado pela Abril, basta bater os olhos na deplorável "reportagem" sobre outro suposto "esquema" petista, desta vez envolvendo a ex-prefeita Marta Suplicy, intitulada "O mensalão da perua", que está na edição corrente (nº 1909, de 15/6/2005) da Veja. Além de não conter nenhuma novidade - a matéria repete uma denúncia também sem provas e até o momento negada inclusive por gente graúda da administração tucana de José Serra -, Veja faz questão de agredir gratuita e pessoalmente a ex-prefeita.

No que diz respeito ao jornal O Globo e à TV Globo, a carapuça também pode acabar servindo. Apesar das desavenças do passado, que teve no episódio da edição do debate entre Collor e Lula, em 1989, o momento de maior estremecimento, a cúpula da empresa e o governo petista parecem ter se entendido desde a campanha de 2002, quando principalmente a emissora concedeu ao então candidato Lula um tratamento nada hostil. Após a vitória, o presidente-eleito retribuiu com a primeira entrevista exclusiva, durante a qual chorou ao assistir à edição de sua própria trajetória de vida.

Já no governo, Lula manteve a divisão do bolo publicitário do governo federal e das estatais praticamente como ela se dava nas gestões anteriores, garantindo assim vultosos recursos para os veículos da Rede Globo. Enfrentando uma grave crise financeira e preparando uma profunda reestruturação, a cúpula global certamente respirou aliviada com as permanências do candidato da mudança.


Passar a limpo

Veja e Globo à parte, o discurso de Jefferson, se bem analisado, contém praticamente uma confissão de culpa. No trecho assinalado em vermelho, o deputado pede a Dirceu que intervenha nos veículos para mudar o tom da cobertura do escândalo dos Correios. Pode parecer banal para quem administra as grandes redações, mas soa incompreensível ao bom jornalismo: então, um deputado acusado de corrupção pode pedir ao ministro da Casa Civil que "opere" para manipular o noticiário, e este ministro, a se acreditar nas palavras de Jefferson, admite fazer tal gestão junto ao maior conglomerado de mídia do país? Ambos agindo com a maior naturalidade do mundo, quase como se estivessem na reunião de pauta do Globo ou montando a escalada do Jornal Nacional...

Ao fim e ao cabo, é quase uma pena que o escândalo do mensalão e a corrupção nos Correios dominem o debate político de forma a ofuscar os tantos outros absurdos revelados por Roberto Jefferson. Porque não fossem esses temas tão mais importantes, seria o caso de pedir a CPI da Imprensa, para passar a limpo a maneira pela qual certas revistas e jornais decidem o que a opinião pública deve saber a respeito do que se passa no Brasil.



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