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La insignia
13 de junho de 2005


Brasil

Caos estável


Marco Aurélio Nogueira
Jornal do Brasil. Brasil, junho de 2005.


Não foram poucos os que falaram em "crise institucional" para qualificar o maremoto em que se afoga o governo Lula nas últimas semanas.

CPI e escândalo dos Correios, PIB em queda, agricultores protestando, desgaste nos índices de popularidade do presidente, rusgas intermináveis entre o PT e o governo e entre as distintas alas partidárias compuseram um cenário de pesadelo, no qual nada parece dar certo. Não há notícias boas e o governo se vê obrigado a inflectir sobre si mesmo para tentar recuperar o fôlego e voltar à luta. A imagem da crise é quase inevitável.

Mas deveria haver mais cautela no diagnóstico. Antes de tudo porque as instituições mantêm seu desempenho habitual. Continuam tão frágeis e tão pouco eficientes quanto antes. Não interagem de modo dinâmico com a sociedade, mas não deixam de refleti-la e de serem por ela reconhecidas. Estão, digamos assim, estabilizadas sem muito brilho, de modo opaco.

Há um fator estrutural nesse processo. Em condições de globalização como as que temos hoje, marcadas por tensões, desencontros e desigualdades brutais e nas quais aquilo que está instituído não dialoga com a vida, o "caos" é a situação normal - um tipo estável de caos, como escreveu certa vez o sociólogo alemão Ulrich Beck.

Nada parece ficar propriamente em pé no mundo de hoje. A turbulência e a incerteza converteram-se em regra, embaladas pela rapidez das mudanças, pela velocidade tecnológica, pela conectividade geral, pela "fuga" dos territórios. Os núcleos de direção, ainda que formalmente constituídos, dirigem cada vez menos, não conseguem se impor. A vida está meio fora de controle, ainda que não role precipício abaixo. E se é assim, por que deveríamos esperar paz e calmaria nos ambientes políticos e governamentais? Por que deveriam os governos governar com desenvoltura e em marcha ascendente?

A política sempre evolui sob céus em que se sucedem relâmpagos tenebrosos e sol radiante, e nada indica que se tenha estacionado sobre Brasília uma nuvem carregada e catastrófica. Não há indícios de que se esgotaram as possibilidades de ação do governo Lula. Seu poder de fogo certamente diminuiu, mas de modo algum é desprezível. Salvo prova em contrário, continua com recursos expressivos para agir e para sobrepujar seus adversários. Esses, além do mais, não demonstram possuir particular capacidade de cerco e de destruição.

O problema é que o governo Lula parece perdido em meio ao tiroteio. Desde seu início tem-se apoiado no tradicional expediente de se legitimar pela política econômica, mostrando-se comedido e pouco criativo em todas as demais áreas. Até hoje não conseguiu estabelecer um eixo em torno do qual se organizar: uma idéia de futuro, uma proposta de gestão, um projeto de Estado. A figura do presidente não se compõe com a do governo, seu partido é mais atrito e tensão que entendimento e não se mostrou, até agora, particularmente capacitado para imprimir um rumo a si próprio ou ao governo. O Planalto, hoje, apresenta grave déficit de articulação política, responsável por tropeços seguidos em sua relação com o Congresso e em sua comunicação com a sociedade. Para piorar, está se fixando, no imaginário social, uma associação entre governo, partido e corrupção, absolutamente indesejável mesmo quando pouco consistente.

Mas o governo ainda dispõe de tempo para encontrar uma saída virtuosa, que o recomponha e o converta em efetivo organizador coletivo. Não tem como se livrar do "caos estável", mas poderá se equilibrar nele.

Se, porém, continuar a bater cabeça e a agir em nome da legitimação pelo econômico - lendo todos os fatos pelo que contém ou não contém de ameaça à estabilidade da economia - tenderá ir cada vez mais para baixo e a se desqualificar. Poderá não haver "crise institucional", mas uma crise de governo será inevitável.



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