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La insignia
4 de junho de 2005


Brasil

Disfarces recentes não negam ambição


Wanderley Guilherme
Linha Aberta. Brasil, junho de 2005.


O "lacerdismo" transferiu domicílio eleitoral para São Paulo. Floração daninha do liberalismo nacional, a etiqueta identificava o movimento de epicentro carioca que durante as décadas de 50 e 60 tantas fez que por fim conseguiu, não digo promover, mas tomar carona em um golpe de Estado, o de 1964. Havia fracassado em 1954, quando o movimento nasceu, outra vez em 1955, e em 1961, depois de atazanar a vida de Jânio Quadros. Deixou fama de esgotar-se na histeria de denúncias sem fundamento, por conta do famoso episódio das Cartas Brandi (de que já nem lembro o conteúdo), e completa irracionalidade política, com assento no que seria a patológica ambição de poder de Carlos Lacerda, fundador e presidente de honra perpétuo (o fanatismo tem dessas hipérboles) da agremiação.

Mas o lacerdismo foi bem mais do que episódico surto de um grupo eleitoral frustrado. Ao contrário, Carlos Lacerda teve certeira percepção de que a União Democrática Nacional, partido de que era um dos líderes, não teria condições de chegar ao poder pelo voto durante seu horizonte de vida política útil. Se a eleição de Eurico Gaspar Dutra, em 1945, apoiado por Getúlio Vargas, ditador recém deposto, pudera ser debitada à desorientação inicial de um eleitorado jejuno, a recondução do próprio Vargas, em 1950, não estimulava equívocos: a maioria do eleitorado preferia mesmo a coligação entre os conservadores do Partido Social Democrata de então e o Partido Trabalhista Brasileiro. O retorno do país às eleições se revelara politicamente irrelevante para as classes médias.

Doloroso destino, o da classe média urbana nacional. Esbaforida e minúscula antes de 30, foi repetidamente surrada pelos representantes da oligarquia rural. Apelou para as armas na década de 20. Depois de 1945, crescida e ocupando as repartições do Estado, que se expandira durante o Estado Novo, viu-se obrigada a repartir o mercado eleitoral urbano com o operariado fabril, também multiplicado sob a ditadura varguista. Juntou-se ao conservadorismo rural em uma frente anti-popular clássica. Reler "A Evolução da Crise Brasileira", do udenista Afonso Arinos, faz bem. O diagnóstico está lá. As classes médias brasileiras nunca experimentaram a glória da transformação da hegemonia ideológica em hegemonia política. São agentes historicamente frustrados, a reboque de lideranças volúveis.

A classe média eleitoral de agora se distingue pela paranóia em relação ao Estado e seu funcionalismo. No passado, um funcionalismo público ascendente incluía o contingente mais vocal dos extratos médios, o que fazia de um comunismo ubíquo o inimigo a ser derrotado pelo voto ou pela força. No presente, é o funcionalismo público corrompido, corruptível, corruptor, e alimentado por um bando de políticos despudorados, o obstáculo à transformação moral da vida cívica. Contam essas classes médias privatizantes, conjunturalmente afetadas em seu bem estar material, com a possibilidade de uma desconfortável aliança com parcela da aristocracia operária, materialmente bem instalada, caso a proximidade - a "sertanização" - não lhes cause o costumeiro asco.

As circunstâncias favorecendo a agitação do golpismo branco estão dadas. Existe uma liderança consciente de que o governo atual, a continuar no mesmo ritmo, dificilmente será batido em 2006. A tentação de macular reputações com escândalos alheios é muito grande para aqueles cuja perspectiva de vida política útil é diminuta. São muitas as condições a serem preenchidas antes que se possa considerar a hipótese de que um golpe branco seja bem sucedido. Mas não é isso que impedirá a agitação, precisamente na medida em que não existem alternativas. Iniciativas belicosas, normais em outros contextos, tendem a adquirir características de putsch com o objetivo de comprometer o governo enquanto não responder a elas. Uma oposição com duvidosa esperança no futuro é uma oposição que teme um governo normal. É também uma oposição sensível a lideranças caudilhescas. Sina quase inescapável dos pequenos partidos. Ocupar o governo está fazendo bem ao PT, havendo transformado o carismático Lula em uma liderança de estatura humana e criticável. Não é impossível, em contrapartida, que o PSDB, a se confirmar a escassa esperança eleitoral, se entregue a alguma variante do PDT de Leonel Brizola, adotando de vez um caudilhismo ilustrado.

P.S. - O nome de Gregório Fortunato é Waldomiro Diniz.


(*) Wanderley Guilherme dos Santos é cientista político e Pró-Reitor da Universidade Candido Mendes.

Artigo publicado no jornal Valor Econômico do dia 2 de junho de 2005.



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