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19 de novembro de 2007

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Cultura
Brasil

Se colar, colou


Luiz Carlos Azedo (*)
Blog Reformista. Brasil, novembro de 2007.

 

Aqui a regra vigente é a alternância de poder. Um partido, legalmente, pode até ficar décadas no poder; um indivíduo, não. A sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva está em todas as cabeças políticas, menos na dele. O presidente da República resolveu brincar de esconde-esconde com a opinião pública e sempre deixa no ar uma interrogação sobre seus verdadeiros propósitos em 2010.

Depois de mandar o deputado Devanir Ribeiro (PT-SP) desativar o movimento para aprovação da emenda do terceiro mandato, Lula resolveu endossar o projeto continuista de seu colega venezuelano Hugo Chávez. Qualificou de democrática a reforma política que dá poderes autoritários ao presidente da Venezuela e possibilita sua reeleição indefinidas vezes. Para Lula, Chávez é um democrata à moda bolivariana e ponto final, quando todos sabem que suas concepções políticas são caudilhescas e golpistas. Ou seja, está longe o último capítulo da novela do terceiro mandato.


Malvinas

As ambições de Chávez não têm limites, inclusive no plano militar: depois de iniciar uma corrida armamentista no continente, anuncia uma aventura nuclear, provavelmente em parceria com o Irã. Como indaga o ex-presidente José Sarney, contra quem a Venezuela se arma? Chávez aparentemente quer tutelar a Bolívia e afrontar a Colômbia, mas não será um espanto se resolver ir à guerra contra a Guiana. A Venezuela nunca aceitou a fronteira com esse país vizinho, ao contrário do Brasil, que inclusive fez concessões territoriais em troca de paz e limites territoriais reconhecidos internacionalmente. Acontece que desastre não costuma ocorrer no ato, mas em conseqüência. Chávez pode se meter numa confusão parecida com a Guerra das Malvinas. Foi nesse episódio que os generais argentinos descobriram que o inimigo principal não era o Brasil, que os Estados Unidos não são um aliado incondicional e que a Inglaterra ainda gosta de exibir seu poderio naval e domínios em além-mar.

Uma boa maneira de compreender um fenômeno é compará-lo com outro. Por exemplo, o que é um criminoso? É o sujeito que conta com a ordem tal qual ela é e nela quer se instalar, considerando roubos, fraudes e saques atividades como outra qualquer. E o que é um rebelde? É aquele que combate a ordem estabelecida para submetê-la à própria dominação, muitas vezes se utilizando das prerrogativas e possibilidades que a própria ordem lhe assegura. Chávez sempre foi um rebelde, o que revelou pela primeira vez quando liderou uma tentativa de golpe militar. Mas hoje está no poder, ao qual chegou por via democrática. Entretanto, pode passar à condição de criminoso, como já ocorreu com outros líderes políticos, se marchar para um regime ditatorial e usar a violência contra a oposição, ou invadir um país vizinho por ambição territorial. Basta perder o poder ou a guerra - ou ambos.


Reeleição

O endosso do presidente Lula ao projeto chavista foi um gesto de boa vontade com o colega, dirá o Itamaraty. Mas é interpretado como uma declaração de descompromisso com as regras do jogo democrático. Na verdade, Lula realimentou as especulações de que manobra para viabilizar um terceiro mandato. A sucessão de Lula, do ponto de vista das forças governistas, virou quebra-cabeças. É certo que o êxito do segundo mandato pode viabilizar a eleição de seu sucessor, mas Lula embaralha o jogo ao impedir que surja um candidato natural da base governista. Na verdade, estimula a proliferação de candidatos fracos no PT (Dilma Rousseff, Antonio Palocci, Marta Suplicy, Patrus Ananias, Tarso Genro) e inibe a consolidação de uma candidatura forte entre os aliados: Ciro Gomes (PSB). Com isso, a nova reeleição se torna a melhor alternativa para que a ampla coalizão de partidos que o apóia permaneça no poder.

Com a declaração de apoio a Chávez, Lula sinalizou que a limitação a dois mandatos não é uma questão de princípio para o Palácio do Planalto. A permanência no poder por longo período, com sucessivas reeleições, é apenas um problema de correlação de forças para estabelecer novas regras do jogo. Depois das eleições municipais, é provável que o projeto do terceiro mandato ressurja com toda a força. Afinal, basta uma maioria governista no Congresso aprovar uma emenda à Constituição e o povo a endossar num plebiscito. O terceiro mandato, assim, dependeria apenas do prestígio eleitoral e de uma decisão de foro íntimo de Lula em 2010.

O Brasil, porém, não é como a Venezuela. Decisão dessa natureza lançaria o país numa crise político-institucional mais grave do que a do vizinho. Aqui a regra vigente é a alternância de poder. Um partido político, legalmente, pode até ficar décadas no poder; um indivíduo, não. Como os partidos são notoriamente desunidos e frágeis, é difícil isso ocorrer. O PT, por exemplo, se distinguia dos demais partidos por sua coesão político-ideológica e estrutura de organização. Teria tudo para fazer o sucessor de Lula, quem sabe um José Dirceu, mas a crise do mensalão e outros senões atrapalharam o projeto partidário. Por isso, na base do "se colar, colou", Lula alimenta a tese do terceiro mandato no imaginário popular.


(*) Luiz Carlos Azedo é membro da Executiva Nacional do Partido Popular Socialista (PPS) do Brasil.

 

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