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La insignia
19 de abril de 2002


Brasil

As lições do golpe venezuelano


Laerte Braga


Os principais jornais da França e do Brasil foram atrás de Lula, estava em Paris, para ouvir a opinião do candidato da esquerda às eleições presidenciais de outubro, sobre o golpe contra Chaves. Lula sumiu, escondeu-se, segundo a imprensa brasileira e setores do próprio PT - Partido dos Trabalhadores - , para não ter que falar e, principalmente, não ser associado a Chaves.

Segunda-feira, quando a realidade era outra, Chaves voltara ao poder, Lula, numa declaração a todos os grandes veículos de comunicação do Brasil disse o seguinte: "eu não sou como Chaves. Eu sou a estabilidade. A esquerda brasileira amadureceu muito".

O ex líder sindical, derrotado em três tentativas de chegar ao governo do Brasil, está jogando todas as fichas no que afirma "ser a minha última chance", assumiu e não esconde de ninguém um caráter conciliador e reformista. Quer vencer as resistências da classe média e mostrar-se confiável às elites.

É, no entanto, o único beneficiado, dentre os candidatos à sucessão de FHC, com a golpe, o contra golpe e a confirmação de Chaves no poder. O efeito desses fatos no imaginário popular traz a certeza que é possível aos "pobres" mudar a sua sorte, a sua sina. Basta sair e caminhar. Lula acredita que possa ser eleito presidente, tem todas as chances (como a política é dinâmica: antes da operação mata Roseana, corria o risco de sequer chegar ao segundo turno) de alcançar a vitória em "minha última chance".

É compreensível que um discurso de chamamento a mudanças políticas, econômicas e sociais não seja revestido de radicalismos inconseqüentes, mas é necessário que a campanha presidencial do candidato das esquerdas e, sobretudo seu programa, não virem um arremedo reformista da pior espécie, pois, aí sim, vira um De La Rúa da vida.

O complô contra Chaves partiu do desvairado que preside os Estados Unidos. Associado a setores tradicionalmente golpistas das forças armadas daquele país, a Venezuela. Participação indefectível da CIA. Todos desembocando nos setores empresariais venezuelanos, Pedro Carmona, presidente da principal associação de empresários de lá.

O volume de informações que agora chegam às redações de jornais e aos jornalistas está a permitir que uma avaliação mais correta e precisa do golpe seja feita. Num primeiro plano não contavam com a reação popular, daí terem determinado o fechamento do Congresso e da Corte Suprema. Isso sugere que o apetite voraz das classes dominantes não tem limites, é pantagruélico.

Os objetivos eram simples: forçar a baixa do preço do petróleo e garantir aos Estados Unidos o ouro negro, de tal maneira que qualquer represália de países produtores do Oriente Médio não afetasse a ação terrorista de George Bush. Quer dizer: Carmona deve ter levado, antecipado, uma boa parte do botim a que teria direito. Foi por isso que disse que faria eleições em um ano. Tempo, quem sabe para dobrar sua fortuna pessoal. Esse gente trabalha movida a isso. Não têm pátria, sequer mãe, são meros argentários.

A reação favorável ao golpe foi de toda a classe dominante, da eterna inconseqüência da classe média (morre de fome mas não perde a pose e a esperança de acordar com sangue azul correndo nas veias). As declarações de amor a Chaves, ou pedidos de conciliação de agora, apenas refletem o desejo de sobrevivência, tanto quanto o temor do futuro. É esse o dilema que Chaves, que é também o de Lula, ou vai ser, caso consiga vencer as eleições: revolução ou reforma?

Revolução não significa sair tacando fogo em tudo. Nem levando o país, qualquer um, a instabilidade. Pelo contrário. Revolução é conseqüência de mudanças efetivas na estrutura política, econômica e social de um país e faz-se a partir de bases populares organizadas, formadas e conscientes. No Brasil, mais que na Venezuela, na Argentina, isso existe. Está aí o MST.

O que Lula precisa entender é que com essa postura vai ser engolido pelas elites. É a postura da dubiedade. Nem lá nem cá. O pressuposto que setores empresariais, ainda mais agora que é preciso resgatar a condição de país soberano do Brasil (viramos um quintal dos Estados Unidos, do capital especulativo, dos bancos, dos grandes grupos, sob a batuta do gerente geral FHC), mas o pressuposto que essa gente abre mão de alguma coisa, é equivocado, além de ser ridículo e perigoso.

Imagine o retrocesso que seria para o continente latino americano, as lutas populares, se o golpe contra Chaves tivesse consumado-se? Imagine Lula presidente reprimindo ocupações do MST? Querendo taxar o envio de remessas ao exterior, remessas de lucros? Exigindo reinvestimentos no País? Ou deixando de subsidiar os principais acionistas do Brasil S/A, os bancos, os grandes grupos econômicos? Ou tentando uma reforma agrária e enfrentando latifundiários que acreditam que tronco e chicote é a melhor forma de "pagamento" ao camponês? Esses setores sequer comem de garfo e faca. São canibais lato senso. Não tem pátria, não têm valores que não sejam os expressos em dinheiro. Essa gente vai cobrar de Lula a tal estabilidade que, aqui, como dita por ele, é conformismo. E isso torna-o vulnerável. Cria riscos para todo o conjunto do movimento popular.

O que o candidato do PT precisa entender é que a história do partido não é a dele, embora em determinado momento, quando era trabalhador, líder de trabalhadores, isso fosse um fato. Essa história de "última chance", "estabilidade", "cumprir os compromissos", tudo isso é apenas pessoal. Mero capricho, projeto pessoal. Só, mais nada. E nem o processo eleitoral é um fim em si. É meio, instrumento para que a classe trabalhadora consiga avançar no processo maior, o revolucionário.

Se Lula não entender isso e a conjuntura internacional sinaliza nessa direção vai ser tempo perdido. Se não for capaz de perceber que estamos num momento agudo da luta de classes, a vaca vai para o brejo, mesmo que ganhe.

Se o PT não foi capaz de trabalhar a organização popular, boa parte ficou atrás de conseguir mandato ou cargo na burocracia partidária e nos governos municipais e estaduais do partido, o problema não é do movimento popular como um todo, é do PT. O preço a ser pago é muito alto.

Essa conversa de estabilidade cheira a "ROTA na rua", como quer um dos principais líderes da direita do partido, o deputado José Genoíno. Ou Lula percebe as coisas, digamos assim, ou as coisas complicam. Os trabalhadores "ganham", mas não levam.



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