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26 de setembro de 2007

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Cultura

A integração pelo conhecimento


Marco Aurélio Nogueira
Gramsci e o Brasil / La Insignia, setembro de 2007.

 

Pesquisadores reunidos no VI Encontro Internacional do Fórum Universitário Mercosul-FOMERCO, realizado em Aracaju entre 12 e 14 de setembro, foram surpreendidos com uma notícia que produziu imediato efeito positivo em sua agenda de trabalho.

Falando na condição de representante ofical do Ministro da Educação, o professor Hélgio Trindade anunciou o iminente início de funcionamento do Instituto Mercosul de Estudos Avançados, iniciativa patrocinada pelo governo brasileiro com o intuito de promover e incrementar pesquisas e atividades educativas voltadas para a integração regional sul-americana. Trata-se da primeira materialização de uma idéia que já apareceu em alguns pronunciamentos presidenciais, qual seja, a de oganizar uma universidade especificamente direcionada para a integração dos países da região.

O fato está revestido de inegável importância simbólica e, sobretudo, de uma louvável sabedoria estratégica, já que a forma encontrada - um Instituto de Estudos, em vez de uma universidade - parece ser bastante adequada, pois se caracteriza pela leveza e pela operacionalidade e pode, com isso, cumprir funções de relevo em curto espaço de tempo e sem muitas turbulências.

O governo poderá, evidentemente, em um segundo momento, cogitar de seguir avante e criar uma Universidade do Mercosul ou latino-americana, como parece ser a expectativa de Lula. Mas terá, desde logo, excelentes condições de atuar na área e até mesmo de descobrir se será mesmo o caso de fazer algo mais abrangente. Poderá verificar, por exemplo, se a criação de uma universidade aberta para a região produzirá frutos efetivos, que formato deverá ter, como será recebida pelos parceiros e que repercussão terá no sistema universitário brasileiro, tanto em termos de custos relativos quanto em termos de adesão e apoio.

Do alto dos seus 15 anos de existência, o Mercosul ainda não conseguiu definir com clareza um caminho para crescer de forma sustentável como efetivo pólo integrador. É inegável que tem cumprido o decisivo papel de manter acesa a chama da integração e ao menos parte de suas realizações na área econômica e comercial são de extrema relevância. Não se trata, de modo algum, como costumam sugerir seus adversários, de um empreendimento esgotado, fracassado ou improdutivo, muito ao contrário. Mas também é evidente que uma integração efetiva dos povos e Estados da região ainda está por ser feita e vive à espera de iniciativas mais criativas e qualificadas.

Deste ponto de vista, o Instituto Mercosul de Estudos Avançados é uma idéia carregada de possibilidades.

Primeiro de tudo, porque pode injetar ânimo e impulso à integração, ajudando a lhe fornecer um pensamento crítico mais estruturado e um sistema regular de formação de quadros. Um instituto com este perfil pode erguer mais alto a bandeira da integração pelo conhecimento, ou seja, valorizar o conhecimento (a cultura, a ciência, as artes) como alavanca estratégica da integração, com o que se alteraria a qualidade mesma do processo em curso até aqui.

Em segundo lugar, pode ajudar a impulsionar a articulação entre instituições, estudantes e professores latino-americanos, facilitando a circulação de idéias e quadros, a pesquisa dedicada, o intercâmbio e a cooperação universitária, coisas sempre mais importantes no mundo de hoje. Pode também, por esta via, auxiliar a que se reforce o valor do ensino superior, não tanto como momento especializado na preparação de jovens para o mercado de trabalho, mas sobretudo como etapa concentrada no fomento da reflexão crítica, da criatividade e do desenvolvimento científico e tecnológico.

Para ser implementada sem sobressaltos e resistências, a idéia terá de evitar os caminhos mais fáceis, onde as tentações e os descuidos tendem a ser maiores. Não poderá, por exemplo, minimizar seu pertencimento ao mundo universitário propriamente dito, que é categoricamente plural, livre, autônomo e democrático. Não há porque acreditar que isso ocorra, mas o empreendimento fracassará se vier a ser, por exemplo, convertido em plataforma política de um ou outro governante tomado isoladamente, isto é, se não se afirmar como algo orgânico àquilo que se costuma chamar de interesses de Estado. Terá dificuldades de decolar, por outro lado, se não privilegiar a articulação com as universidades realmente existentes, a começar dentro do próprio Brasil.

Uma imagem plausível a este respeito é a de um instituto que opere como uma espécie de universidade-rede, que alimenta e é alimentada por tudo aquilo que pulsa no mundo universitário. Ou seja, suas chances de sucesso crescerão na medida em que for parte de um projeto amplo, voltado para o ensino superior como um todo, que hoje abarca, como se sabe, um vasto conjunto de instituições, pessoas e iniciativas (como é o caso da Cátedra Memorial da América Latina, que funciona em São Paulo).

O mundo universitário atual tem vida, cor e cara. Mas carece de melhor concatenação, de maior comunicação e de uma perspectiva cooperativa mais consolidada. A universidade hoje existente não é certamente pouca coisa: sua história precisa ser reconhecida, defendida e valorizada. Mas é também um compósito de lacunas e carências, de indefinições e dúvidas perante a sociedade globalizada, frenética e individualizada em que vivemos. Falta uma idéia magnética para as universidades latino-americanas do século XXI. Quem sabe a integração não venha a ser um dos eixos para o encontro desta idéia?

No que diz respeito ao ensino superior, a integração subcontinental significará essencialmente mais e melhor articulação entre aquilo que já existe. Poderá implicar a criação de novas universidades, certamente, mas esta não parece ser a carência maior, ao menos no momento atual. Se o foco é integrar, nada mais adequado do que começar por agregar e potencializar o que já está pronto, à espera de um sinal para agir.

 

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