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La insignia
3 de fevereiro de 2006


Brasil

O Dimasduto e os telejornais


Fernando Soares Campos
La Insignia. Brasil, fevereiro de 2006.


"Comme on fait son lit, on se couche", dizem os franceses. "Quem tem mãe na zona não pode chamar ninguém de filho da puta", digo eu.

Em julho de 2005, decorridos dois anos e meio de governo Lula, foi deflagrado, de forma bombástica, o esquema de caixa 2 da campanha do PT. A oposição alardeou: "O maior esquema de corrupção da história!". Os empréstimos tomados pelo PT, no Banco Rural, com o aval do empresário Marcos Valério, logo foram denominados pejorativamente de "Valerioduto". Agora veio à tona o esquema de caixa 2 do governo FHC, na campanha de 2002, quando o seu candidato José Serra foi derrotado por Luís Inácio Lula da Silva, no segundo turno, com a expressiva votação de 53 milhões de eleitores optando pelo PT. A arrecadação do dinheiro para a campanha do PSDB, segundo denúncias documentadas, foi feita por Dimas Fabiano Toledo, diretor de Furnas Centrais Elétricas, no governo de Sua ex-Excelência Fernando Henrique Cardoso, cacique do PSDB, hoje transitando entre Nova York, "Europa, França e Bahia".

Dimas Toledo é unha e carne com o governador Aécio Neves (PSDB-MG), por isso mesmo, quando Lula assumiu o governo, Aécio, provavelmente com medo de que outra figura assumisse a direção de Furnas e descobrisse o esquema montado por Dimas para financiar a campanha do PSDB e partidos coligados, pediu a Lula que mantivesse aquela "nobre criatura" na Diretoria de Obras da estatal; contrariando outra ex-Excelência, o ex-presidente Itamar Franco, que também queria o controle de Furnas Centrais Elétricas para um dos seus afilhados. Lula preferiu atender ao pedido de Aécio Neves: manteve o fera Dimas Toledo em suas Furnas. Dimas sempre foi assim, ó, com as empreiteiras. Durante muitos anos ele foi o arrecadador do "por fora", com o qual fazia o caixa das campanhas dos seus patrões. O homem lidava com o controle de qualidade da empresa, e empreiteira que tem juízo não briga com assa gente; paga.

Quanto ao Roberto Jefferson (PTB-RJ - presidente do partido), o governo Lula permitiu que este indicasse alguns afilhados para diretorias dos Correios, onde Jefferson plantou Maurício Marinho, um dos seus capachos.

Bom, lá estava Lula tocando seu governo, arrumando as finanças do País, criando seus programas de assistência social, viajando mundo afora, em busca de novas parcerias comerciais para o Brasil, tudo na quase santa paz. Mas não sabia ele que a turma de FHC estava aprontando.

Jefferson, sujeito ganancioso, não andava nada satisfeito, pois o pessoal do PT não estava mais permitindo recebimento de propina, marcava no pé, mesmo não podendo escapar de certas falcatruas, pois são 500 anos de corrupção, e os camaradas têm norrau (pronuncia-se know-how). Tanto é que a Skymaster, empresa aérea que freta suas aeronaves para os Correios, e financiou uma parcela da campanha do senador Arthur Virgílio (PSDB-AM - líder do partido), ganhou nova concorrência neste governo. Mas que estava difícil tirar dinheiro à base de propina, isso é verdade. E aí não tem Jefferson que agüente ter seus afilhados em cargos de "confiança" e não poder mamar nas tetas que o cargo representa. O homem ficou puto da vida. Mas teve uma brilhante idéia: saiu dizendo pra todo mundo que o PT estava comprando votos de seus aliados, a fim de que estes permanecessem fiéis ao governo e votassem em seus projetos. Até para o presidente Lula ele contou essa. Quando o chamavam para denunciar isso no plenário da Câmara, Jefferson saltava fora, desconversava. Afinal, aquilo fazia parte de seu macabro plano para desmoralizar e, se possível, acabar com o governo.

Segunda etapa do plano Jefferson (só do Jeff?).

Ele chamou seu cupincha Maurício Marinho e disse:

- Mauricinho, sabe que tu tens uma pinta de galã?
- Eu, chefinho?!
- Sim, tu mesmo. E pra provar que estou falando a verdade, até já arranjei um papel pra tu num filme que estou produzindo.
- Nem acredito!
- Pois pode botar fé. Tu vais ser o meu Dimas Toledo lá nos Correios.
- E cumé que eu faço? Cadê o script?
- Taqui, ó - Jefferson entregou o roteiro da peça a Mauricinho.

Depois de dar uma corujada nos originais, Marinho aceita seu papel em "Três merrecas prum corrupto de terceira".

Marinho ainda contestou:

- Ô, chefinho, num é pouco demais não?! Só três merrecas!! Meus filhos vão reclamar! Lá na escola deles, os coleguinhas vão dizer: "Meu pai é mais corrupto que o teu!" Num dá pra ser três milhões não?!
- Não! Aí, como é que a gente vai dar close na grana? Se for muita bufunfa, além de não caber no teu bolso, a gente daria muita bandeira, abrindo a pasta pra dar close na propina. Vai ser só três merrecas mesmo. Você pega, dá uma paradinha, a câmera discreta dá um close, em seguida, você coloca no bolso.
- Mas essa produção já tem distribuidores?
- Se ainda não tem mas vai ter. Vai ser a película do ano. Se duvidar, a gente ganha um Oscar de melhor canalhice do ano.

A película foi rodada. Os produtores entregaram o filme à imprensa. Estourou o escândalo das três merrecas nos Correios. Jefferson disse que aquilo foi coisa do Zé Dirceu para incriminá-lo. Marinho disse que estava só brincado. A nação se indignou. Jefferson aproveitou a "covardia" do Dirceu, fez que ficou indignado com o chefe da Casa Civil e resolveu contar "tudo" sobre o esquema de caixa 2 do PT. Falou até que aquilo era ainda pior do que simples esquema de financiamento de campanha:

- Esse dinheiro, na verdade, era pra compra de votos dos parlamentares da base do governo. O pagamento era feito regularmente. Portanto eu o batizo de "mensalão".

A oposição vibrou:

"Joga pedra no PT! Joga bosta no Delúbio, Dirceu, Marcos Valério e outros infames! Eles foram feitos pra apanhar!, foram feitos pra cuspir! Eles dão pra qualquer um, malditos petistas!!!"

Durante os seis últimos meses de 2005, a população brasileira teve que agüentar a mídia cobrindo CPIs, esculachando o governo Lula, e os parlamentares da oposição fazendo devassa nas contas do Marcos Valério.

Jefferson e Mauricinho saíram de cena.

Agora, faz mais de um mês, surgiu outro esquema de caixa 2. Desta vez o da oposição. O DIMASDUTO. A imprensa relutou para não apresentar o caixa 2 do PSDB. Ninguém queria falar nisso. Aqui e ali, alguém tocava no assunto, assim, pelas beiras. Os petistas pressionaram. Fizeram guerrilha na internet. Bombardearam as redações. Ninguém tava nem aí.

Ontem, 1° de fevereiro, finalmente, os telejornais apresentaram o caixa 2 do PSDB, o DIMASDUTO. Mas, pasme, o fizeram como se fosse VALERIODUTO, o caixa 2 do PT. Pasmou?! Bom, nesse caso, creio que você não conhece essa gente, esses que acham que o telespectador é a cara do Homer Simpson.

A coisa foi feita assim: nenhuma palavra sobre Serra (R$7.000.000,00), Alckmim (R$9.300.000,00), Aécio Neves (R$5.500.000,00) ou outro qualquer das planilhas de Furnas. Falava-se de Furnas, caixa 2, campanha de 2002, corrupção e o bufão Jefferson, o único que "assumiu" ter recebido dinheiro (R$75.000,00), conforme consta na planilha do caixa 2 de Furnas, no governo do intelectual Fernando Henrique Cardoso.

Sei que milhões de telespectadores neste Brasilzão não entenderam patavina. Não atinaram para o fato de que aquilo eram denúncias contra o governo FHC. Pelo contrário, tudo foi montado para induzir o grande público ao erro, aquelas pessoas que não lêem as colunas dos articulistas de plantão, milhões delas. Assisti a dois telejornais: BAND e JORNAL NACIONAL (este nem fez chamada na abertura do programa). Ambos trataram a matéria de forma idêntica: nada de Serra, nada de Alckmim, nada de Aécio nem de outro político qualquer que conste no rol dos que supostamente receberam dinheiro; exceto Goldman, que foi citado por ter espinafrado o governo Lula.

Nos jornais impressos, comenta-se e até se dá os nomes (nas planilhas constam uns dois caminhões deles), mas nos telejornais, que seria o fato tratado no atacado, para o grande público, nada! Se fosse valerioduto de verdade, teria: Lula (na cabeça), Dirceu (mesmo chutando cachorro morto), todos os governadores, senadores e deputados que, supostamente, receberam por fora na campanha de 2002.

As planilhas existem, tornaram-se públicas via internet, não dá pra esconder do público leitor, precisava-se dar uma satisfação a esse público que exige, para o governo FHC e seus aliados, o mesmo tratamento bombástico ("O maior esquema de corrupção do mundo!!!") que deram ao caixa 2 petista.

Jefferson foi lá fazer seu papel, o mesmo desde o início. Disse que recebeu 75 merrecas. Até parecia que ele estava sendo imparcial. Mentira, tudo mentira, teatro.

Na TV, fizeram-lhe a pergunta:

- Você acha que "alguém" mais na lista recebeu dinheiro? (grande pergunta!)
- Não sei, pergunte a "eles", eu respondo por mim (foi nesses termos).

Mas esse "alguém" e "eles" não tinham nomes nos telejornais.

Ninguém pode duvidar que Jefferson foi lá, mais uma vez, fazer o seu papel, dar continuidade à explosiva denúncia que armou contra o PT no ano passado. Jefferson conhece bem o papel que desempenhou. As redações sabem o que fazem.

Talvez agora ele saia de cena de uma vez por todas. Apesar de já ter apresentado sua filha como candidata para as próximas eleições.

No jornalismo brasileiro sempre teve essa coisa: um papo para os letrados e semiletrados, nos jornais impressos; outro para o grande público, na televisão: "De Boner para Homer".

P.S.: Se alguém achar que alguma coisa neste artigo não bate com a verdade, vá reclamar nas redações dos telejornais, pois, baseado em suas veiculações, foi o que entendi.



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